Passei
os últimos anos com a sensação que o tempo nunca seria o suficiente para eu
viver tudo o que queria. Acho que as primeiras palavras do dia nos últimos anos
eram “vamos logo para não atrasar” (verbalizada ou apenas internamente). Eu sempre tinha a sensação de que 24 horas
não era o suficiente para dar conta de tudo. E se eu olhar pra trás, realmente
não era. Mas não era falta de horas na verdade e sim uma ansiedade que eu nem
sabia detectar. Uma ansiedade que estava camuflada na minha maneira de ver o
mundo, na forma como eu tinha escolhido viver e nas prioridades da época.
A mudança em ver o mundo de outra
forma começou quando mudei de casa e fiquei mais perto da escola da minha filha.
Na época eu me permitia alguns dias, quando não precisa chegar tão cedo,
levá-la andando, outras vezes no carrinho. E de repente eu vi que o tempo era suficiente
desde que eu permitisse enxergá-lo de outra forma. Eram dias inesquecíveis
quando nós duas íamos andando e vendo as flores no chão. Ela parava e fingia
ligar seu rádio imaginário para dançar em frente a um prédio escolhido aleatoriamente.
Eu me sentia esquisita algumas vezes em perceber que não olhava mais direito as
árvores, não percebia que aqueles três quarteirões tinham tantas paradas
mágicas e que o tempo estava passando e eu perdendo o crescimento da minha
filha. Sim, eu escolhi ser mãe. Eu desejei isso. Eu tive uma gravidez que não
foi adiante antes da Sofia e tentei de novo. No começo era apenas um incômodo
que estava ali, mas não ganhava muito espaço porque o tempo era sempre contado
e não permitia muitas reflexões.
Este ano o caminho para escola era
outro. Às vezes conseguíamos acordar mais cedo para irmos caminhando, na
verdade ela no carrinho apreciando a paisagem e me ensinando novamente a
enxergar a beleza da simplicidade. Voltei a olhar mais para as árvores,
apreciar as folhinhas caindo de manhã, a me encantar com as flores do caminho
que eu ganhava em um gesto de delicadeza e amor da minha filha. Sabe aquela
sensação esquisita, essa ganhou espaço principalmente na caminhada da volta da
escola sozinha. Eu percebi que não precisava mais de 24 horas no dia, eu
precisava mudar o foco da minha vida. E foi assim caminhando pelas ruas,
olhando as pessoas correndo, casais de mãos dadas, crianças no carrinho, gente
apressada, pessoas felizes, pessoas emburradas que eu decidi mudar o jeito de
caminhar não só na rua, mas na minha vida. Fui buscar novos horizontes, a
realização de um sonho antigo que foi iniciado quando eu tinha apenas 15 anos e
decidi fazer magistério. Voltei para o mundo da educação e hoje ando na rua
vendo o que ela tem para me oferecer. Podem ter certeza que é muito mais que
carros correndo, pessoas brigando com o tempo. A rua é um espaço comum que pode
ensinar muito se a observarmos de outra maneira.
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